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Quem visita a Universidade de Coimbra, não imagina que o sótão do Departamento de Ciência da Vida guarda uma das maiores e mais completas coleções de crânios e esqueletos identificados do mundo.

O austero prédio de 1576 é um antigo colégio jesuíta no estilo maneirista com fachada ampla e recortada por grandes janelas simétricas. O visitante ao entrar pela porta da Antropologia, como é conhecida, se defrontará com um o jardim interno e lances de escadas ladeadas por azulejos pintados à mão que narram cenas do cotidiano e grandes feitos dos bravos navegadores portugueses pelos quatro cantos da Terra.

A contribuição da nação ibérica para o Brasil vai além da maneira de pensar o mundo através da língua portuguesa. O pioneirismo da saga lusitana pelo mundo legou às sociedades modernas o pensamento do ignoramus – “nós não sabemos”, mas “podemos descobrir”, rompendo finalmente com crenças e mitos cristalizadas por séculos na mente do homem medieval.  Nesse momento estava dado o primeiro passo da odisseia humana pelo saber científico, como conta Yuval Noah Harani da Universidade Hebraica de Jerusalém, no seu livro “Sapien”.

Museu Antropológico da Universidade de Coimbra

O Museu Antroplógico da Universidade de Coimbra representa um dos mais importantes centros de pesquisa científica, produção de conhecimentos e desenvolvimento tecnológico na área de Antropologia Forense, Física e Bioarqueologia.  

O museu ocupa um amplo espaço no sótão do Departamento de Ciências da Vida por onde se chega através de vários lances de escada terminando em uma estreita porta. Ambiente climatizado, com claraboias que permitem a entrada de luz natural e com máquinas de desumidificação para conter à degradação do tecido ósseos por fungos e bactérias.

Coleções osteológicas

Os restos humanos estão perfeitamente organizados em caixas retangulares em incontáveis corredores de prateleiras. O controle de acesso é restrito. A coleção do museu é formada por amostras ósseas de cidadãos comuns identificados (coleções de trocas internacionais, médicas I, II e III), por restos ósseos de populações antigas e batalhas históricas, como a de Aljubarrota, de 1385, entre portugueses e castelhanos, e vítimas de genocídio por decapitação, ocorrida no século XX.

As coleções osteológicas que formam o museu antropológico surpreendem visitantes e pesquisadores pelo número de crânios e esqueletos identificados. O acervo é formado por cerca  2.000 crânios e 800 esqueletos identificados, o que faz dele um dos maiores do gênero.

Soma-se a isso, o excelente estado de conservação e fontes bem documentadas sobre os dados ante-mortem da coleção, como filiação, naturalidade, idade á época da morte e provável causa mortis.

São informações importantes para pesquisas científicas relativas aos hábitos dos indivíduos (experiência de cárie dentária em populações passadas), desenvolvimentos de métodos modernos de estimativa de perfil biológico (sexo, idade, ancestralidade e estatura) de restos humanos em contextos forenses, pesquisas sobre fatores de individualização, paleopatologias, traumatologia, entrou outras linhas de investigação.

Um acervo singular

É um acervo singular no mundo científico e interesse corrente de pesquisadores de várias nacionalidades. O estreito intercâmbio científico entre a Dra. Eugénia Cunha, professora e coordenadora do Laboratório de Antropologia Forense da Universidade de Coimbra, com pesquisadores e peritos brasileiros tem impulsionado o desenvolvimento da Antropologia Forense no Brasil, especialmente por meio de cooperação interinstitucional, colaboração em pesquisas, em perícias, desenvolvimento de novos métodos e realização de cursos e treinamentos para brasileiros no país e no exterior.

A simbiose dessa rede formada por Coleção Osteológica – Pesquisa/Perícia Antropológica – Pesquisadores/Peritos contribui no salto qualitativo da formação dos recursos humanos na área e, revela-se de importância capital em Estados democráticos. A Universidade de Coimbra é o porto, o Museu Antropológico é a embarcação, os pesquisadores e peritos são navegadores e o horizonte, o saber científico de um mundo que não prescinde de justiça.

Autor convidado

Gustavo Barbalho Guedes Emiliano

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